A mãe que sofreu aborto na lama e luta para incluir feto entre vítimas de Mariana


04.11.2016 - Hora desta Atualização - 22h00

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Urso de pelúcia soterrado em Bento Rodrigues, após rompimento de barragens da Samarco.

"Pensa em milhões de trovoadas de uma vez. Era o barulho da lama. As paredes da casa começaram a tombar em cima da gente. Meu irmão gritava. Veio a lama e arrancou meu filho de 2 anos e minha sobrinha dos meus braços. Foram os dois, dentro da lama. Eu afundei. Não enxergava mais nada."

Priscila Monteiro, de 28 anos, fazia aniversário naquela tarde de quinta-feira, 5 de novembro de 2015, em Bento Rodrigues, vilarejo perto de Mariana (MG). Estava grávida de 3 meses. Faria um ultrassom no dia seguinte. "Queria muito saber o sexo do bebê."

"Aí, senti a dor do aborto. A dor do aborto. Perdi meu bebê e fui arrastada pela lama. Eram ondas, eu afundava, me cortava toda. Engoli muita lama. Furei meu rosto e cortei costela, pernas, braços, nádegas. Meu maxilar saiu do lugar. A lama levou toda minha roupa."

Narrada um ano depois à BBC Brasil, a história de Priscila ilustra o impacto da maior tragédia ambiental brasileira de que se tem notícia e vai além do leito cor de barro do Rio Doce, dos peixes e margens contaminados, dos destroços de casas sem teto.

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Ela foi arrastada por mais de um quilômetro e ficou 13 dias internada. No segundo dia, soube que o filho Caíque fora encontrado vivo. No quinto, lhe disseram que a sobrinha Emanuele Vitória, 5, havia morrido. O marido e o segundo filho, de 9 anos, estavam bem.

Desde então, pede que o bebê que carregava na barriga seja reconhecido como a 20ª vítima fatal da tragédia. Mas a dona da barragem rompida, a mineradora Samarco, controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, nega responsabilidades sobre o feto.

Laudos

"A Samarco diz que o estouro da barragem não seria suficiente para ela perder o bebê", diz o advogado de Priscila.

Procurada pela BBC Brasil, a empresa disse que "não comentará o assunto". A reportagem enviou quatro perguntas à mineradora:

- A Samarco reconhece a perda do bebê em decorrência da tragédia?

- Que medidas compensatórias a empresa propôs ou proporá?

- A família pede que o bebê seja incluído na lista de vítimas. Seria o 20º óbito. Qual é o comentário da empresa?

- A Samarco inicialmente questionou a gravidez de Priscila. Por quê?

Na única vez em que comentou oficialmente o caso, há seis meses, a Samarco informou que contratou um especialista para examinar Priscila e que ele constatou que ela não estava grávida.

"Será que é por que eu tinha perdido o bebê?", questiona hoje Priscila, irritada. Ela diz que nunca viu o resultado do exame.

Seus advogados apresentaram à reportagem três fichas médicas. "Encontrava-se grávida, com confirmação laboratorial e clínica, até a última consulta", diz um deles. "Gestante de 8 a 12 semanas", diz outro. "O obstetra que a avaliou informou que perdeu o bebê", diz o terceiro.

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"Não são 19, são 20 (mortes). Meu filho é vitima. Eu amava. Eu tinha roupinhas", diz a jovem, que hoje mora em Mariana com a família - o marido e dois filhos.

No aniversário de um ano da tragédia, a família ainda se adapta à nova vida em Mariana.

"Meu filho Caíque volta para casa chorando da escola porque chamam ele de 'pé de lama'. Chamam a gente de aproveitadores. Ele não tem mais liberdade para brincar na rua, aqui eu não vou pra soltar (de casa)."

A reportagem pergunta por quê. "Ele pode ser atropelado, roubado, morto. Tem gente que mata aqui por nada."

Séria durante toda a entrevista, sem rir ou chorar, Priscila conta que a empresa ofereceu acompanhamento psicológico às vitimas logo após o desastre.

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Tentou, mas não frequentou as sessões por muito tempo.

"Parei porque os psicólogos pediam para eu esquecer. Como esquecer? Eles pediam para eu contar como aconteceu. Eu contava tudo e eles falavam: voce tem que esquecer. Eu perdi meu bebê, minha sobrinha morreu, meu filho quase morreu. Como assim esquecer?"

Para Paulo Avila Fagundez, professor de bioética e biodireito da Universidade Federal de Santa Catarina, o episódio pode ser interpretado pelo conceito de "nascituro", presente na legislação brasileira.

"A pessoa passa a existir a partir do momento em que o feto sai do ventre. Mas a lei indica os direitos do nascituro, aquele que ainda virá a nascer, porque o aborto é hoje um crime contra a vida no Brasil."

Para a lei, explica o professor, o nascituro é como "uma pessoa virtual", "uma expectativa de vida humana".

"Segundo a lei, qualquer interrupção que ocorra no curso da gestação é crime e passível de punição, e quem comete o aborto na pessoa responde por crime. Nesse caso, o acidente foi responsável pelo aborto, contra a vontade da gestante."

Nove meses depois da tragédia, diretores das mineradores reconheceram pela primeira vez que o episódio foi fruto de uma obra na barragem. O anúncio foi feito pelos presidentes da Samarco e da Vale e pelo diretor comercial global da BHP - jornalistas não foram autorizados a fazer perguntas na ocasião.

"Eu queria ver o presidente da Samarco um dia", diz Priscila.

"Se eu tivesse feito um aborto, estava presa, teria cometido um crime. Ele arrancou meu filho à força do meu ventre e nada acontece." Fonte: BBC noticias

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Nota de www.rainhamaria.com.br

Diz na Sagrada Escritura:

"Debaixo do sol, observei ainda o seguinte: a injustiça ocupa o lugar do direito, e a iniqüidade ocupa o lugar da justiça". (Eclesiastes 3, 16)

"Pus-me então a considerar todas as opressões que se exercem debaixo do sol. Eis aqui as lágrimas dos oprimidos e não há ninguém para consolá-los". (Eclesiastes 4, 1)

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"Porque conheço o número de vossos crimes e a gravidade de vossos pecados, opressores do justo, exatores de dádivas, violadores do direito dos pobres em juízo". (Amós 5, 12)

"Ouvi isto, exploradores do necessitado, opressores dos pobres do país!" (Amós 8, 4)

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"Entretanto, Vós Vedes tudo: Observais os que penam e sofrem, a fim de tomar a causa deles em vossas mãos. É a vós que se abandona o infortunado, sois vós o amparo do órfão. Esmagai, pois, o braço do pecador perverso; persegui sua malícia, para que não subsista. O Senhor é Rei Eterno, as nações pagãs desaparecerão de seu domínio. Senhor, Ouvistes os desejos dos humildes, confortastes-lhes o coração e os atendestes. Para que justiça seja feita ao órfão e ao oprimido". (Salmos 9, 35-39)

 


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