Padre Zezinho, a dissidência calculada e a Comunhão na boca


03.04.2012 - Em artigo recente, publicado em seu site e intitulado Cátedra de Pedro ou câmera do padre?, o padre Zezinho redigiu algumas considerações com as quais definitivamente não posso concordar. Ele começa tentando definir a expressão “dissidência calculada”; para isto, faz referência a um “neoconservadorismo que adota modernidade em alguns quesitos e volta ao passado no quesito que lhe interessa voltar”. No entanto, mais adiante, os ditos “dissidentes”, segundo o sacerdote, são aqueles que “teimam em receber a eucaristia só na boca, nunca nas mãos”!

Da maneira como redige o reverendíssimo sacerdote, aquelas pessoas que desejam receber Jesus Eucarístico na boca e de joelhos seriam rebeldes e desobedientes. “São dissidentes calculados. Desobedecem sem desobedecer. E dão um jeito de chamar de desobedientes os que não se regem pelos mesmos textos que eles.”

Sobre este tema, vários são os pontos a serem considerados. Para o padre dehoniano, “temos católicos que sistematicamente desafiam as normas das dioceses e paróquias, alegando que os líderes dos seus movimentos estão acima da diocese e da paróquia”. Mas, o que observamos na prática não é isto. Os argumentos que muitos católicos usam para defender a comunhão na boca – e de joelhos – estão, pelo contrário, em consonância com a Tradição da Igreja, com o Magistério da Igreja e com as palavras do atual Pontífice Romano, o Papa Bento XVI.

Primeiro, é visível o apelo de inúmeros Santos católicos – especialmente dos Padres da Igreja – a fim de que nenhum fragmento da Hóstia consagrada se perca. Assim se manifestam São Cirilo de Jerusalém, São Jerônimo, Santo Efrém, Santo Hipólito, São Cesário de Arles e São João Crisóstomo. Lembra ainda o Papa Pio XI que “ao administrar o sacramento eucarístico deve-se mostrar um particular zelo a fim de que não se percam os fragmentos das hóstias consagradas, dado que em cada um deles está presente o Corpo inteiro de Cristo” 1. Ora, está evidente que receber a Comunhão na boca representa, neste sentido, um risco muito menor do que comungar na mão.

Mais: em notificação emitida em 1985 pela Sagrada Congregação para o Culto Divino, a Igreja deixou clara uma coisa da qual talvez o pe. Zezinho tenha se esquecido:

Os fiéis jamais serão obrigados a adotar a prática da comunhão na mão; ao contrário, ficarão plenamente livres para comungar de um ou de outro modo. Essas normas e as que foram recomendadas pelos documentos da Sé Apostólica atrás citados, têm por finalidade lembrar o dever do respeito para com a Eucaristia independentemente do modo como se recebe a Comunhão.  Insistam os pastores de almas não só sobre as disposições necessárias para a recepção frutuosa da Comunhão, que, em certos casos, exige o recurso ao Sacramento da Penitência; recomendem também a atitude exterior de respeito que, em seu conjunto, deve exprimir a fé do cristão na Eucaristia.”

E, em 1999, no boletim Notitiae, a mesma Congregação fez um esclarecimento ainda mais incisivo: “Aqueles que obrigam os comungantes a receber a santa Comunhão unicamente nas mãos como também aqueles que recusam aos fiéis a Comunhão nas mãos nas dioceses que utilizam tal indulto, procedem contrariamente às normas estabelecidas. (…) Em todo caso, é para desejar que todos tenham presente que a tradição secular consiste em receber a Comunhão sobre a língua. O sacerdote celebrante, caso exista perigo de sacrilégio, não dê a Comunhão nas mãos dos fiéis e exponha-lhes as razões porque assim procede.” (Os trechos acima compilados também foram extraídos do site Cleofas)

Por fim, quem fala é o Papa Bento XVI. Em entrevista concedida em 2010 ao jornalista alemão Peter Seewald, ele explicou porque, muitas vezes, em seu pontificado, administrou a Sagrada Comunhão na boca e de joelhos.

“Não sou contra a Comunhão na mão por princípio: eu mesmo a administrei assim e a recebi também desta maneira. Fazendo com que a Comunhão seja recebida de joelhos e que seja administrada na boca, quis dar um sinal do temor e colocar um ponto de exclamação acerca da Presença real. Não por último, porque justamente nas celebrações de massa, como aquelas na Basílica de São Pedro ou na Praça, o perigo da banalização é grande. Ouvi falar de pessoas que colocam a Comunhão na bolsa, levando-a quase como se fosse um souvenir qualquer. Num contexto semelhante, no qual se pensa que é óbvio receber a Comunhão – da série: todos vão lá na frente, então também faço o mesmo -, queria apresentar um sinal forte, isto deve ficar claro: ‘É algo particular! Aqui está ele, diante dele é que caímos de joelhos. Prestem atenção! Não se trata de um rito social qualquer, do qual se pode participar ou não’.”

- Luz do Mundo: O Papa, a Igreja e os sinais dos tempos
III Parte, Capítulo 15, Como acontece a renovação?
pp. 190-191; Ed. Paulinas, 1ª edição. São Paulo, 2011.

As recomendações da Igreja são bem claras. Comungar diretamente na boca não se trata de mera opinião de lideres de movimento, ou de campanhas solitárias de sacerdotes tradicionais aqui ou acolá. Não se trata, como quer padre Zezinho, de “dissidência calculada”. É, pelo contrário, “tradição secular” católica.

Sobre o mesmo assunto, recomendo a leitura do livro de Dom Athanasius Schneider, o famoso “Dominus Est! – É o Senhor!”, sobre “o dom inestimável da Sagrada Comunhão”. Está disponível para leitura no Scribd. Para quem, entretanto, não tem tempo para fazer a leitura, urge ler o artigo da série “Mitos Litúrgicos comentados”, escrita pelo Francisco Dockhorn e revisada por Dom Antônio Rossi Keller, sobre a comunhão de joelhos e na boca.

Sim, há muitos bons textos escritos pelo padre Zezinho. Há alguns meses, chamou-me a atenção um em que ele diferenciava a Santa Missa de um reles concerto. Neste último artigo, porém, o reverendíssimo sacerdote definitivamente não foi feliz.

Graça e paz.
Salve Maria Santíssima       -    Por Everth Queiroz Oliveira

* * *

Também é recomendada a leitura da instrução Memoriale Domini, sobre a maneira de distribuição da Sagrada Comunhão.

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1. Instrução da Sagrada Congregação da disciplina dos sacramentos, de 26 de março de 1929: AAS 21 (1929) 635.

Fonte: http://beinbetter.wordpress.com

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