Por que o lamento, a Igreja está dividida? Por que não podemos simplesmente deixar de lado nossas diferenças? Porque duas coisas opostas não podem logicamente ser ambas verdadeiras


13.01.2017 -

Com Quantos Dedos Francisco Está Resistindo Agora? Amoris Laetitia e Submissão

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Como tenho dito, um dos efeitos mais úteis e proveitosos deste pontificado foi o de revelar as falhas intelectuais, doutrinárias e formativas dos prelados católicos modernos. Continuem falando, pessoal, para que todo mundo possa ver e decidir. Estamos no tempo do Grande Esclarecimento

Hilary White – OnePeterFive – 10 de janeiro de 2017 | Tradução Sensus Fidei:

Esta semana já nos foram oferecidas duas entrevistas que muito prestativamente delineiam as principais divisões na Igreja hoje e a razão pela qual ela agora está terminantemente dividida em dois campos implacavelmente opostos, e que, neste momento, lutam pela supremacia. Estes campos opostos, naturalmente, são os mesmos dois lados que se encontram envolvidos há cinquenta anos em uma prolongada Guerra Fria Civil e que, com a publicação de Amoris Laetitia, estoura na consciência pública, armas em punho.

Com efeito, as duas divergentes cosmovisões das entrevistas também ilustram o grande abismo que existe em todos os aspectos do discurso social por toda parte das terras outrora conhecidas como Cristandade. Elas nos dão um critério sobre exatamente porque Amoris Laetitia —  e as exigências estridentes de submissão a este documento — são tão importantes como uma linha de demarcação entre os remanescentes do velho mundo e o Admirável Paradigma Novo [Nota do tradutor: Brave New Paradigm: a autora faz uma alusão ao livro Admirável Mundo Novo, do escritor fabiano Aldous Huxley, em inglês: Brave New World] que tem lutado para o controle de nossa civilização desde o início do século 20.

Padre Antonio Spadaro, amigo próximo do papa, publicou uma entrevista hoje, em La Civilta Catholica com Cardeal Christoph Schönborn, o prelado a quem o Papa disse ser o “intérprete” autorizado de Amoris Laetitia. No mesmo dia, temos uma outra entrevista com o cardeal Burke por Michael Matt, editor da venerável revista Remnant.

Na primeira, Spadaro pergunta ao cardeal Schönborn:

“Alguns falaram de ‘Alegria do Amor’ como um documento menor, uma opinião pessoal do papa, sem valor magisterial completo. Qual o valor que esta exortação possui? É um ato do Magistério? Isso parece óbvio, mas é bom especificá-lo agora, a fim de impedir que algumas vozes criem confusão entre os fiéis quando afirmam que este não é o caso. …”

Sua Eminência responde:

“É óbvio que se trata de um ato de magistério: é uma exortação apostólica. É claro que o Papa está aqui exercendo seu papel como pastor, como mestre e mestre da fé, depois de beneficiar da consulta dos dois sínodos.”

Na entrevista de Remnant, Mike Matt dirige ao Cardeal Burke essencialmente a mesma pergunta: Amoris Laetitia é “autoritária”, no sentido de uma exigência pelo consentimento por parte dos fiéis.

O cardeal americano responde:

“Como eu disse desde o início, a própria forma de Amoris Laetitia, e, atualmente, as palavras do Papa dentro do documento, indicam que não é um exercício do magistério papal. E a maneira como o documento necessariamente é lido, tal como acontece com todos os documentos, tendo em conta a luz do ensinamento constante e prática da Igreja. E então as declarações em AL que estão de acordo com o ensino e a prática constante da Igreja são seguramente muito finas. Mas há uma série de declarações que estão na maior confusão e devem ser esclarecidas e é por isso que nós quatro cardeais apresentamos, de acordo com a prática clássica da Igreja, cinco perguntas ao Santo Padre que tem a ver com os próprios fundamentos da vida moral e o constante ensinamento da Igreja a esse respeito”.

Observe atentamente essas duas respostas para discernir a grande diferença na compreensão subjacente do que o Catolicismo atualmente é. Burke abordou a natureza do conteúdo do documento, pedindo-nos para considerar se o que diz é objetivamente católico.

Schönborn preocupa-se somente pelo fato de que o documento em si veio do papa. É ensinamento católico porque o Papa diz que é. Seu conteúdo é irrelevante. Se ele contradiz 2000 anos de prática, se contradiz as palavras do próprio Cristo na Escritura — é irrelevante. É o Papa, portanto, está autorizado.

É só depois de estabelecer este como o mais alto critério que o purpurado se preocupa em abordar o conteúdo do documento, dizendo: “Eu não tenho dúvida de que deve ser dito que este é um documento pontifício de grande qualidade, um ensinamento autêntico da doutrina sagrada, o que nos leva de volta à contemporânea relevância da palavra de Deus.” Mas mesmo aqui revela a sua mentalidade positivista, o que implica uma contradição que — sim, adúlteros podem agora receber a comunhão — pode ser de alguma forma justificada simplesmente porque é 2017.

Verdade, realidade, natureza humana, intenções de Deus — e, portanto, o Catolicismo — são todos mutáveis, e é o trabalho dos clérigos (bem, alguns clérigos) descobrir o que agora é. Schönborn novamente:

“Somos levados de maneira viva a estabelecer uma distinção entre a continuidade dos princípios doutrinais e a descontinuidade de perspectivas ou expressões historicamente condicionadas. Esta é a função a que pertence o Magistério vivo: interpretar autenticamente a palavra de Deus, escrita ou transmitida”.

Esta, aliás, é uma expressão do manual do Neo-Modernismo; a ideia de que a  doutrina católica deve ser “reformulada”, ou seja, expressa em novas formas para se adequar ao “homem moderno”.

Em seu próximo parágrafo, Schönborn é ainda mais explícito sobre as intenções do Papa em abandonar fundamentos filosóficos tradicionais católicos sobre a natureza da realidade, incluindo a natureza humana, como imutáveis:

“Nesta esfera das realidades humanas, o Santo Padre renovou fundamentalmente o discurso da igreja — certamente segundo a linha de sua exortação apostólica “A alegria do Evangelho”, mas também da “Constituição Pastoral do Vaticano II sobre a Igreja no Mundo Moderno”, que apresenta os princípios e reflexões doutrinais sobre o ser humano de hoje que estão em uma contínua evolução. Há uma profunda abertura para aceitar a realidade.”

Não nos é dito, exatamente, quais são esses “princípios doutrinais”. Mas todos os dias nos dizem que, não importa o que sejam, nós somos obrigados a nos submeter a eles.

As declarações contrastantes nessas duas entrevistas ilustram que nossas divisões se baseiam em duas compreensões irreconciliáveis sobre a natureza da realidade, e, portanto, do Catolicismo, nos mais altos níveis da Igreja.

A primeira dessas duas divergentes cosmovisões é:

Positivismo [1] — Verdade, realidade, é o que nós percebemos que é; por conseguinte, a religião católica é o que dizemos que ela é. E isto não tem nenhuma relação com a realidade exterior — que ela possa ou não existir é, em qualquer caso, irrelevante. O Catolicismo pode e deve ser mudado, mesmo em seus fundamentos, para atender às mutáveis necessidades da sociedade, dos homens e mulheres contemporâneos ou de qualquer critério que decidamos. Não só não existe uma natureza humana imutável que permaneça sujeita às mesmas leis morais ao longo da história humana, mas não há natureza análoga à verdade ou mesmo a Deus. Deus pode mudar Sua mente, e cabe a nós discernir, examinando os “sinais dos tempos” ou as tendências da história (ou qualquer outra coisa) qual seja a Sua nova vontade para os seres humanos.

A ideia de que há uma natureza imutável à Verdade e que ela se aplica igualmente em todos os tempos à natureza humana imutável é inerentemente opressiva, regressiva e injusta, legalista, rígida e “não-pastoral”.

A única coisa que precisamos saber é que esta vontade mutável de Deus é transmitida através do papa, e somente o papa, e/ou seus representantes escolhidos. “Faça o que eu disse” deve ser o todo da lei para todos nós.

A segunda cosmovisão é:

Realismo Epistemológico [2] — A realidade existe de uma maneira particular fora de nossas percepções e apreensão da mesma. O uso apropriado do intelecto humano é descobrir e articular essa realidade, incluindo a realidade última de Deus e Sua relação com o homem. Assim, o Catolicismo nada mais é do que uma descrição precisa da realidade externa objetiva, imutável, e não pode ser alterado pelo fiat humano. O Catolicismo, para o Realista Epistemológico, tem a mesma qualidade de valor em relação à realidade objetiva que têm a matemática e a física.

Esta é a cosmovisão filosófica “clássica” que formou o fundamento do que hoje chamamos de pensamento e civilização “ocidentais”. Neste paradigma, não é possível a Igreja um dia dizer que algo é proibido, e depois afirmar que, através do “desenvolvimento” ou do “discernimento pastoral” essa mesma coisa é agora permitida. Um “não” não pode “se desenvolver” através do mero transcorrer do tempo ou das diferenças culturais em um “sim”.

Sob este paradigma, o Catolicismo, inclusive na sua “prática pastoral” em “casos concretos”, é um todo unificado que é racional; nunca contradiz ou conflita consigo mesmo — inclusive com seu passado — ou com fenômenos observáveis.

O realismo epistemológico é, simplesmente, a ideia de que “a realidade é uma coisa real” e que pode, em alguns aspectos, ser apreendida pela percepção humana, através da razão[3]. Ele apareceu em registros históricos na Grécia e foi desenvolvido em um fluxo contínuo através dos filósofos medievais e tem informado o pensamento Católico desde a fundação da Igreja. É também o fundamento de toda a ciência natural moderna desde a geometria de Euclides até as observações astronômicas de Galileu e Copérnico, das ciências médicas e biológicas à NASA. Sua aplicação no Catolicismo baseia-se na premissa de que existe uma coisa como uma natureza Divina e uma natureza humana que são as mesmas em todos os tempos e lugares.

Estamos vendo, cada vez mais, que na Igreja é o positivismo que constitui o fundamento filosófico da revolução pós-conciliar. É por isso que nós que escrevemos sobre esta situação começamos a usar o termo “Positivismo Papal” para a ideia de que o papa pode, por algum tipo de poder místico concedido pelo seu escritório, decidir qual é hora de mudar a prática eucarística para se opor à doutrina eucarística.

Além disso, a resposta furiosa às Dubia por muitos prelados a favor do papa — com acusações histéricas de “cisma” sendo lançadas aos quatro cardeais — mostra-nos até onde leva o positivismo. Amoris Laetitia demonstra que, como princípio orientador, o Positivismo Papal se reduz a um exercício de puro poder político, baseado em uma suposição de capacidade divina de um papa para mudar ou simplesmente ignorar a própria natureza da realidade.

Poder-se-ia dizer que Amoris Laetitia são os quatro dedos orwellianos sendo sustentados diante de toda a Igreja, com a exigência de que todos nós digamos que são cinco. O conteúdo real, o número real dos dedos, é irrelevante. A única coisa que conta é a nossa vontade em nos submeter.

Há poucos dias, pouco antes de publicar esta entrevista, Spadaro disse ao mundo inteiro no Twitter que a nova teologia não tem nada a ver com a realidade objetiva, e que insistir o contrário é pensar errado.

O fato de que o novo Paradigma Anti-Racional ainda não recebeu uma submissão adequada foi demonstrado pelo apontamento e risadas deste absurdo em seu feed no Twitter. Ele foi bastante e impiedosamente interrogado por isso.

Esta declaração manifestamente antirracional foi tomada, com razão, como um sinal de uma mente meio desequilibrada, ou de alguém tão intelectualmente deformado que é incapaz de um pensamento maduro, ainda menos de qualquer tipo de comentário valioso.

Além disso, por mais espantoso que possa parecer, Spadaro não removeu o post embaraçoso, como se alguém tivesse sido descuidadamente pego postando algo bobo que prejudicasse a causa. Em vez disso, ele redobrou, tentando em posts adicionais justificar e defender esta “posição”. Evidentemente ele não viu nada de errado com ela, não conseguia entender por que tinha recebido tal reação, e nada aprendeu com as muitas correções — algumas aparentemente não irônicas — que recebeu como resposta.

Enquanto não conseguíamos parar de rir, ele respondeu da única maneira que um positivista pode responder: através da força. Ele bloqueou todos aqueles que haviam comentado. O fato de achar que o seu post faria algum sentido levou-o a tentar defendê-lo, e então respondeu com a força, ainda que sendo a parte mais hilariante do negócio mas, também, a mais reveladora.

Como tenho dito, um dos efeitos mais úteis e proveitosos deste pontificado foi o de revelar as falhas intelectuais, doutrinárias e formativas dos prelados católicos modernos. Continuem falando, pessoal, para que todo mundo possa ver e decidir. Estamos no tempo do Grande Esclarecimento.

Hoje, graças a Spadaro e Schönborn nos dizerem o que realmente pensam, somos capazes de compreender mais claramente do que na semana passada, porque o Papa Bergoglio os colocou no cargo de interpretar e divulgar as suas ideias. Este é o papa que não vê dificuldade em propor ideias divergentes e logicamente opostas de um dia para o outro. Quem não tem nenhum escrúpulo em simplesmente mudar 2000 anos de ensino e prática católica, de reescrever a Escritura para se adequar a esse ou aquele ponto homilético (Não, sua santidade, o milagre dos pães e peixes não foi sobre “compartilhar”, nem foi também apenas uma “parábola”.)

O que as pessoas que condenaram essas incompreensíveis contradições não entenderam é que o “significado” é irrelevante. O propósito dessas comunicações não foi informar os fiéis católicos sobre o pensamento ou as reflexões do papa sobre a Escritura. O conteúdo é irrelevante; apenas a submissão conta, apenas o poder. Isso significa que quanto mais ambíguo, mais contraditório, mais vago, mais ilógico, melhor.

E isso é o que as pessoas não estão percebendo. Ele tem sido perfeitamente consistente em todas as suas respostas, uma vez que ele está sempre dizendo a mesma coisa: submissão. Na verdade, tivemos recentemente um relatório de que ele sabe muito bem que seu trabalho para mudar o ensino antigo da Igreja deve apoiar-se exclusivamente no puro exercício do poder bruto. Quando o cardeal Müller do antigo Santo Ofício perguntou por que Francisco havia exigido a repentina demissão de três de seus melhores sacerdotes, o papa teria respondido como todos os tiranos: "EU SOU O PAPA. Eu não tenho que responder a ninguém".

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O positivismo, a negação de uma realidade objetiva, deve levar em última instância, ao autoritarismo. Se não há nenhuma realidade objetiva, não há necessidade de regras que a considerem; qualquer noção de Regra de Direito é sem sentido. O que vimos acontecer, ao longo da história, quando a Regra de Direito é quebrada? Só pode haver Regra do mais Forte, Regra de Poder. É por isso que, agora que o princípio do fazer-realidade-conforme-você-vai-junto está firmemente estabelecido no escritório papal, o papa deve reprimir tão furiosamente a “dissidência”, até mesmo a “dissidência” suavemente diplomática de se pedir educadamente um esclarecimento.

O que Amoris Laetitia significa?

“Significa o que eu digo que significa. Significa calar a boca.”

Francisco é o papa de muitos “primeiros”, mas nenhum deles tão importante como sendo o primeiro papa a usar o papado para demolir o Catolicismo de seus mais elementares fundamentos filosóficos. Ele é o primeiro papa a usar o pontificado como um meio de injetar o novo Princípio Antirracional na Igreja, um exercício de arrogância quase incompreensível. Alguém, além disso, que não poderia ter ficado impune há 50 anos atrás, mas agora tornado possível pelo triunfo quase universal da mesma vacuidade filosófica em toda a nossa civilização. Foi-nos dito que em toda nossa existência a realidade objetiva não conta e podemos decidir por nós mesmos.

O que fomos falhos em compreender foi que, em um vácuo de realidade, quem tem mais poder decidirá por nós.

O Princípio Antirracional é ascendente na Igreja, mas porque é uma proposta insustentável, deve ser imposto através da força bruta, uma situação que não pode ser mantida indefinidamente, como os imperadores e tiranos do passado todos sabiam. Perante esta anti-racionalidade, um homem calmo, mesmo reticente, como o Cardeal Burke, pode lançar o terror no coração de um tirano apenas afirmando a verdade óbvia.

Publicado originalmente: OnePeterFive – How Many Fingers is Francis Holding Up Now? Amoris Laetitia and Submission

Fonte:www.sensusfidei.com.br

Notas

[1] O positivismo é a teoria filosófica do conhecimento que afirma: “a informação é derivada da experiência sensorial, interpretada por meio da razão e da lógica, [e] constitui a fonte exclusiva de todo conhecimento autorizado”.

[2] “A verdade consiste em uma correspondência entre as representações cognitivas e a realidade”.

[3] “Razão” é a aplicação da lógica aos fenômenos observáveis para perceber com precisão a realidade. Pressupõe, portanto, que haja uma realidade imutável e objetiva a ser percebida.

 

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